Introdução de contextualização histórica
Por que a Jordânia dominava a Cidade Velha de Jerusalém?
A independência de Israel foi proclamada em 14 de maio de 1948. No dia seguinte as tropas do Egito, Síria, Jordânia, com apoio de batalhões do Líbano, Iraque e Arábia Saudita avançaram sobre as fronteiras do que deveria ser o Estado Árabe, definido pela Partilha da Palestina do Mandato Britânico, uma ação descolonizadora e anti-imperialista, impedindo sua existência pelas armas. As tropas da Legião Árabe, sediada na Jordânia, somavam 10.000 soldados, treinados, equipados e comandados por oficias britânicos.
Apenas 14 dias depois, a Legião Árabe tomava toda a Cidade Velha de Jerusalém (pela Partilha, seria não pertenceria nem ao Estado Judeu, nem ao Estado Árabe, e seria uma zona internacional) e rapidamente expulsa todos os judeus de lá. Isso jamais foi considerado como limpeza étnica. Pelo contrário, apenas uma ação justa, justificada e dentro da lei. Como assim?
Quando o Império Britânico realizou, unilateralmente a primeira partilha da Palestina do Mandato Britânico, criou o reino Hashemita da Transjordânia, transferindo a tribo Hussein de Hejaz (pois o país Arábia Saudita não existia e seria criado pelos Estados Unidos em 1935) e lhes dando a Transjordânia, conforme prometido pelo coronel Lawrence, o Lawrence da Arábia, pela ajuda da tribo para combater os turco-otomanos na Primeira Guerra Mundial. A tribo Saud, não colaborou. Hussein, era então o Xerife de Meca, o governador de Meca e todos se mudaram para a Transjordânia.
No estatuto de constituição do novo país, existia a cláusula “livre de judeus”, isto, cinco anos antes de Hitler sequer ser preso na Alemanha e começar a escrever o Mein Kampf. Livre de Judeus, legalmente foi uma criação britânica.
Sendo assim, a Legião Árabe, apenas cumpriu as leis de seu país e expulsou todos os judeus da Cidade Velha de Jerusalém. No dia seguinte, 29/mai, o Rei Abdulah, visitou a Cidade Santa (na foto). Até 1950 a Cisjordânia era um “território ocupado” pela Jordânia. Mas, naquele ano, o governo jordaniano a anexou e passou a fazer parte integral do território da Jordânia.
Ainda em 1948, o rei Abdulah iniciou um processo de “desjudaização” da Judeia e Samaria (a tal Cisjordânia, nome igualmente britânico). Em poucos anos, 58 grandes e médias sinagogas, principalmente em Jerusalém e Hevron, foram derrubadas, demolidas com dinamite. Os cemitérios judaicos foram profanados e muitas lápides foram removidas para se tornarem pisos para as rotas de serviço de guarda jordaniana, escadas, e também de latrinas para os soldados muçulmanos. Mas, novamente, não se preocupe: isso nunca foi considerado limpeza étnica ou racismo, apenas normalidade. Até hoje se pode encontrar lápide de túmulos judaicos com parte de paredes de casas árabes em Jerusalém Oriental.
Jerusalém como cidade sagrada para os muçulmanos
Aqui veremos tudo que faltou contarem para você nas escolas judaicas e muito menos na história geral pelo MEC.
Jerusalém foi rapidamente conquistada no início da expansão islâmica no século 7. O califa Omar a cercou no ano de 636 e entrou na cidade alguns meses depois, já em 637. Pela verdade, até o ano de 1917, Jerusalém pertenceu aos muçulmanos (diversas etnias e ramos diferentes, inclusive uns beligerantes contra outros), exceto por curtos períodos quando os Cruzados Católicos conseguiram vencer e tomar a cidade. Jerusalém pertencia então ao Império Bizantino católico.
Portanto, a fala muçulmana de que “Jerusalém sempre foi nossa”, faz sentido dentro da existência do Islã, e é uma bobagem pois desconsidera que existia um mundo antes do século 7. Por exemplo a data islâmica para o ano de 2025 é 1446, com a contagem iniciada a 16 de julho de 622, dada a fuga de Maomé de Meca para Medina.
No ano de 1187, a última Cruzada de Jerusalém foi derrotada e nos 730 seguintes os muçulmanos dominaram a cidade. O último pouco mais de meio milênio, foi sob o jugo do Império Turco-Otomano muçulmano sunita. Ao longo destes 730 anos, a importância de Jerusalém para o islã, como centro religioso, foi praticamente zero e durante o século 19, de onde já existem fotografias, a explanada das Mesquitas e o Domo da Rocha são locais com mato alto, sem manutenção alguma.
Em algum momento do século 16, o sultão Turco criou a área aberta em torno do Domo da Rocha, com a intenção de criar no local uma alternativa ao Haj (a peregrinação anual a Meca que cada muçulmano deve realizar, pelo menos, uma vez na vida). Isso tornou o Domo da Rocha em uma mini-Kaaba, onde os muçulmanos teriam espaço externo para formar os círculos de pessoas e darem as voltas rituais obrigatórias do Haj. A ideia era boa: ir até Jerusalém, vindo da Turquia, era muito mais rápido e barato que ir até Meca. O trajeto podia ser feito a pé, ou de caravela aportando em Jaffa e daí andando apenas 60 km. Pelo que conta a história turca, isso funcionou por poucos anos, mas não era a mesma coisa que Meca e as pessoas decidiram não ir.
O local onde está do Domo da Rocha, pela historiografia muçulmana, foi escolhido pelo califa Omar para fazer a primeira oração na cidade após sua conquista. Mas por que ali? Durante o cerco, Omar se aproximou de parte da população judaica e um deles se tornou conselheiro. Subindo o Monte de Templo e encontrando lá em cima apenas escombros, perguntou ao judeu onde ficava o altar do antigo Templo de Jerusalém, destruído pelos romanos quase 600 anos antes. Sobre os escombros do Templo o Imperado Adriano tinha construído o Templo de Jupiter, obra iniciada no ano 136. Quando o Império Bizantino assume Jerusalém 200 anos depois, este templo também já não mais existia. Não há qualquer informação histórica se ele foi destruído ou simplesmente ruiu, o que é mais provável.
E o conselheiro judeu, indicou ao califa muçulmano o local onde estava o Santo dos Santos. As tropas removeram muitos escombros até chegarem à Rocha e lá Omar fez a primeira oração muçulmana em Jerusalém. O local ganhou sua primeira edificação em 692, no Califado Omiada, desabou no ano 1015, e foi reconstruído diversas vezes desde então. O formato atual é do Império Turco-Otomano, e sua cúpula é de madeira. A pintura da cúpula em ouro que dá o cartão postal de Jerusalém, ocorre somente entre 1959-61 pelo governo jordaniano. Foi reformada e retocada em 1993.
A Jordânia, país criado através de “lapís e gim”, como é mais adequado lidar com diplomacia britânica, não tinha qualquer ponto de referência muçulmano. Imagine sair de Meca e ir para Necas. Quando Jerusalém foi tomada, em 28/mai/1948, o rei Abdullah, inteligentemente, criou uma nova aura mística para a Mesquita de Al Aqsa (sequer citada durante os 500 anos de dominação turco-otomana) e para o Domo da Rocha. Finalmente a Jordânia passou a ter uma referência islâmica de fato milenar.
O general muçulmano que comandou o cerco de Jerusalém no ano 636 chamava Abu Obaida. Caiu a ficha? É o pseudônimo, cheio de significado para os muçulmanos e não significando nada para as outras pessoas, do porta-voz da ala militar do Hamas, já morto por três vezes durante a Guerra de Gaza. Morre um, outro assume o pseudônimo de quem cercou e capturou Jerusalém para os muçulmanos pela primeira vez.
Até hoje existem pessoas que chamam o Domo da Rocha, como Mesquita de Omar, cortesia da mídia europeia desde o século 19. A mesquita do Omar existe e é o imóvel ao lado do Santo Sepulcro.
A Primeira Libertação de Jerusalém
Foi no dia 9 de dezembro de 1917 que as tropas turcas abandonaram a cidade e o governador militar se rendeu a dois sargentos e um soldado britânicos de uma pequena patrulha, pondo fim aos 1.281 anos de domínio quase total dos muçulmanos sobre a Cidade Santa. A campanha militar britânica, na Primeira Guerra Mundial que partiu do Egito rumo norte, pelo território turco-otomano, onde também havia tropas austríacas e alemãs (principalmente aviação), inclusive com soldados judeus, foi comandada pelo general Allemby. Ah, é por isso que tem ruas e locais com este nome em Israel! Sim, é ele mesmo.
Normalmente este fato importantíssimo na história humana e na geopolítica é deixado de lado, como se nunca tivesse existido.
Em 1921, com o Tratado de Sévres, o Império Turco-Otomano é desfeito e retalhado. No “Levante” que é o nome pelo qual os turcos chamavam a Palestina (nome romano-católico) foram estabelecidos dois mandatos pela Liga das Nações. O Mandato Francês, englobava o território onde hoje está situado Líbano, a Síria e parte do Curdistão. O Mandato Britânico englobava onde hoje estão Israel (com Judeia, Samaria e Gaza), Jordânia e Iraque. Na discussão estava o pleito dos curdos de ser restabelecido do Curdistão, mas os britânicos ignoraram e o Curdistão histórico que antes era dividido entre Turquia e Irã, passou a ser dividido em quatro, com áreas também na Síria e no Iraque.
Libertação de Jerusalém em 1967
Os dados deste texto vêm do livro “The Battle for Jerusalem: An Unintended Conquest (50th Anniversary Edition)” 2017, A Batalha por Jerusalém: Uma Conquista Não Intencional, do autor Abraham Rabinovich, jornalista e escritor norte-americano, com livros publicados sobre todas as guerras de Israel. Por sua vez, o livro trás trechos de documentos liberados após o sigilo militar de 50 anos. A narrativa dos movimentos é diferente da história tradicionalmente contada.
Capturar Jerusalém, a Cidade Velha não era nem mesmo um pensamento passageiro quando o Guerra dos Seis Dias começou, mas após 48 horas, a bandeira israelense estava tremulando sobre suas muralhas. Foi uma conquista não intencional cujas reverberações ainda prendem Israel e os palestinos em um abraço violento.
Na véspera do conflito de 1967, o ministro da Defesa Moshe Dayan advertiu os comandantes do exército para não entrarem em Jerusalém, para evitar provocação às forças jordanianas.
Um ataque preventivo estava prestes a ser lançado contra o Egito, cujo exército estava se mobilizando rapidamente no Sinai, e a Síria estava aguardando nos bastidores. Israel não queria abrir mais uma frente.
“Vocês não devem complicar a posição dos israelenses em relação à Jordânia,” Dayan disse. Se as coisas corressem mal em outro lugar, poderia ser impossível reforçar Jerusalém, se necessário.
Na manhã de 5 de junho, quando 200 aviões estavam retornando de um ataque preventivo contra bases aéreas egípcias, o primeiro-ministro Levi Eshkol enviou uma mensagem ao Rei Hussein, da Jordânia, que havia assinado um pacto de defesa com o Egito na semana anterior. Se a Jordânia não fizesse nenhum movimento hostil, Eshkol escreveu, Israel também não faria.
Às 10 da manhã, a Jordânia abriu fogo ao longo da linha que dividia Jerusalém e em outros lugares ao longo da fronteira. O genreal Uzi Narkiss, Comandante Central, ordenou que as tropas respondessem de forma equilibrada – tiros de fuzil por tiros de fuzil, rajadas de metralhadora por rajadas de metralhadora – mas não escalassem. Ele esperava que a honra da Jordânia fosse satisfeita com a sua “saudação” de abertura. No entanto, logo o primeiro de cerca de 6.000 projéteis de artilharia começou a descer sobre Jerusalém israelense, abafando o som de armas pequenas.
Israel nunca divulgou antes, mas 1.000 edificações de Jerusalém Nova foram atingidas e danificadas pela artilharia jordaniana.
À medida que a força aérea recolheu os relatórios de seus pilotos, tornou-se evidente que o ataque preventivo tinha sido devastador. Após uma rápida reviravolta e um segundo ataque aéreo, a Força Aérea Egípcia praticamente deixou de existir antes do meio-dia.
As divisões blindadas egípcias no Sinai também estavam começando a rachar. Uma brigada israelense de paraquedistas que deveria saltar atrás das linhas egípcias naquela noite, foi informada de que seu alvo já havia sido invadido por tanques israelenses. Em vez disso, a brigada estava sendo levada para Jerusalém para reforçar as defesas da cidade. As defesas da parte nova, o lado Israelense, contra a parte oriental e Cidade Velha, o lado jordaniano.
Israel havia se preparado por duas semanas para uma luta existencial, possivelmente contra vários países árabes; turistas haviam fugido do país e milhares de sepulturas foram escavadas nas principais cidades. Agora, como relatórios de batalha otimistas começaram a filtrar através do Sinai, mentalidades começaram a mudar, mas o Estado-Maior ainda estava relutante em expandir a luta com a Jordânia em uma guerra de movimento.
O ponto de virada veio no início da tarde, quando num relatório sobre a Rádio Cairo foi captado que as tropas jordanianas haviam capturado um enclave israelense no Monte Scopus, no norte de Jerusalém.
O enclave, a meia milha atrás das linhas jordanianas, incluía os campi originais do Hospital Hadassah e da Universidade Hebraica. Seus defensores resistiram durante a Guerra da Independência 19 anos antes. Sob um acordo de armistício, a crista estratégica permaneceu sob controle israelense, sua guarnição de 120 homens era trocada todos os meses sob proteção da ONU.
Apesar do relatório da Rádio Cairo, Scopus não havia sido atacado, mas Narkiss tomou o anúncio como uma declaração de intenções. Com a aprovação do Estado-Maior, ele colocou um contra-ataque em movimento. (Ele iria mais tarde manter que se não fosse o relatório da rádio, a Cisjordânia e a Cidade Velha poderia muito bem ter permanecido em mãos jordanianas.)
A brigada de paraquedistas foi ordenada a romper as formidáveis defesas jordanianas que guardavam a rota para Scopus e aliviar a guarnição.
Narkiss disse ao comandante da brigada, Col. Mordecai Gur, para posicionar um de seus batalhões no Museu Rockefeller em frente às muralhas da Cidade Velha, no caso de o governo decidir invadir. Até agora, não havia indicação de que o estivesse considerando.
Ministros que viviam no litoral dirigiram-se a Jerusalém na tarde do primeiro dia para participar de uma reunião de gabinete no Knesset (na Jerusalém Nova), com seus carros incongruentemente misturados com uma coluna blindada.
O edifício Knesset, com apenas um ano de idade, estava cheio de parlamentares e jornalistas trocando rumores sobre o progresso da guerra. O tema principal era Jerusalém. Será que – deveria – o exército tomar a Cidade Velha?
Quando a reunião do gabinete começou no abrigo do Knesset, a renovação dos bombardeios jordanianos pôde ser ouvida do lado de fora. Dois ministros de extremos opostos do espectro político pediram pela primeira vez a captura da Cidade Velha – Menachem Begin na ala direita e Yigal Allon, do movimento kibutz, na esquerda. Ambos disseram que a história não perdoaria o governo se não aproveitasse a oportunidade para restaurar o domínio judaico sobre o local da Jerusalém bíblica 2.000 anos após sua queda para os romanos.
Desde 1965, Menachem Begin estava na coalizão GAHAL – Gush Herut–Liberalim (Bloco Liberdade-Liberais), de centro direita, partido formado pela aliança entre o Herut e o Partido Liberal. Em 1973, o GAHAL seria um dos partidos a se fundir na coalizão LIKUD (Consolidação). Em 1973 o partido foi mal, mas na eleição seguinte, removeu a esquerda do poder que mantinha desde 1948. Em 1967 Begin tinha a função (hoje inexistente) de Ministro do Gabinete do Primeiro-Ministro) que pode ser entendida com um braço de trabalho para lidar com diversos tema. O primeiro-minsitro em 1967 era Levi Eshkol (do MAPAI, o Partido dos Tarabalhadores da Terra de Israel, o fundador do estado), que acumulava o cargo de ministro da defesa até o dia 5 de junho, quando nomeou o general Moshé Dayan para a função.
Ironicamente, ministros do Partido Nacional Religioso, cujos herdeiros políticos nominais liderariam, posteriormente, o movimento de colonos na Cisjordânia, se opuseram à ideia. Eles expressaram preocupação de que o mundo cristão, liderado pelo Vaticano, nunca aceitaria o domínio judaico sobre os locais mais sagrados da Cristandade.
O chefe do partido, o ministro do Interior Haim-Moshe Shapira, falou com força contra a anexação. A melhor solução, disse ele, é a internacionalização da Cidade Velha. “Para a Jordânia não vamos devolvê-lo,” disse ele. “Para o mundo, sim.”
Um ministro, observando que os judeus haviam orado por Jerusalém nos últimos 2.000 anos, sugeriu que seria melhor continuar fazendo isso em vez de se envolver politicamente com a comunidade internacional. Outro, do partido Eshkol, advertiu que a ONU poderia decidir internacionalizar toda a cidade, incluindo o lado israelense, se Israel tentasse anexar Jerusalém jordaniana.
Os líderes israelitas ainda eram assombrados pela memória de como, em 1956, após a Campanha do Sinai, as ameaças de sanções econômicas de Washington e a intervenção militar de Moscou forçaram o primeiro-ministro David Ben-Gurion a renunciar às suas esperanças de manter os israelenses no Sinai. Essa memória estava claramente na mente de Eshkol quando ele se dirigiu ao gabinete. “No setor jordaniano, estamos a avançar sabendo que seremos obrigados a sair de Jerusalém [Jordaniana] e da Cisjordânia [após a guerra].”
Dayan “mostrou pouco entusiasmo” pela conquista da Cidade Velha, escreveu o historiador Ami Gluska. O diário de Ben-Gurion’ registra uma conversa com seu ex-assessor, agora trabalhando para Dayan. “Moshe não quer conquistá-la [a Cidade Velha],” o assessor disse, “porque ele não quer ter que devolver o Muro das Lamentações.” Dayan tinha na véspera da guerra dito ao gabinete “Não temos qualquer objectivo territorial.”
A Cidade Velha era um prêmio tão monumental que alguns ministros questionaram se um país com uma população de menos de três milhões de habitantes poderia ousar reivindicá-lo. Por outro lado, como poderia o Estado judeu renascido não reivindicá-lo?
As raízes de judaicas não estavam em Tel Aviv ou mesmo na Jerusalém moderna, capital de Israel, mas na cidade com o mesmo nome que ficava em uma estreita faixa de terra a uma milha de onde eles se sentavam.
O Estado-Maior, que tinha planos de contingência em seus cofres lidando com alvos potenciais em todo o Oriente Médio, não tinha nenhum para Jerusalém – a Cidade Velha, literalmente a poucos passos dos bairros israelenses – nenhuma designação de qual portão romper, nenhum plano de batalha dentro dos muros.
O público israelense foi mantido no escuro durante todo o dia sobre os desenvolvimentos no campo de batalha após o anúncio inicial da guerra às 8 da manhã. Aqueles que entendiam o árabe podiam ouvir alegações exuberantes da Rádio Cairo e da Rádio Amã, mas o alto-comando israelense temia que revelar prematuramente os sucessos de Israel levasse a ONU a pedir um cessar-fogo antes que a vitória fosse selada.
Não foi até uma hora após a meia-noite – 17 horas após o anúncio inicial de confrontos com o Egito – que a Rádio Israel introduziu o chefe de gabinete do exército Yitzhak Rabin sem aviso prévio. Apesar da hora, quase todos os adultos do país estavam acordados e ouvindo.
Falando calmamente, o general Rabin informou que as tropas israelenses chegaram a El Arish no Sinai e que Jenin, na Cisjordânia, havia caído. Foi a primeira confirmação de que a guerra estava sendo travada não dentro de Israel, mas em território inimigo.
Rabin foi seguido pelo comandante da força aérea, general Mordecai Hod. Em voz seca, ele descreveu o golpe infligido por seus aviões as forças aéreas do Egito, Jordânia, Síria e Iraque, informando o incrível número de 400 aviões inimigos destruídos neste dia, a maior parte deles no chão. As perdas israelenses foram dadas como 19 aviões.
A brigada de pára-quedistas se uniu ao Monte Scopus após o amanhecer do segundo dia, após uma feroz batalha em Ammunition Hill e Sheikh Jarrah, na qual sofreu pesadas baixas. Do cume, seus comandantes olharam para uma vista espetacular da Cidade Velha adjacente.
Sugerimos a todos que visitarem Jerusalém a irem à Colina da Munição, que possui um museu espetacular, montado no bunker jordaniano, com o um acervo enorme e objetos, fotos e armas, daquele dia. E se pode andar nas trincheiras jordanianas, preservadas até hoje, e constatar como se tratava de um objetivo dificílimo a ser tomado, ainda mais, porque Israel não tinha artilharia nesta batalha. Mas, quando se vai lá hoje, e nada se vê do que se via em 1967, é preciso entender que a cidade cresceu ao redor e que era linha de visão desimpedida, hoje não é. É normal que visitantes lá, não compreendam direito como é que a Colina da Munição controlava os acessos a Jerusalém e coordenava fogo preciso de artilharia jordaniana, se não dá para ver nada. É um dos museus militares que deveria ser de visita obrigatória em Israel.
Dadas as divisões dentro do gabinete, o ministro das relações exteriores, Abba Eban, propôs que a captura discutida da Cidade Velha fosse anunciada como uma resposta tática ao bombardeio jordaniano, adiando assim a questão de seu status futuro e deixando em aberto a possibilidade de um recuo. (Cerca de 1.000 edifícios em Jerusalém israelense foram atingidos por projéteis, mas por serem com acabamento em pedra os danos foram limitados.) Eshkol adotou a sugestão de Eban.
Soldados jordanianos sobreviventes que estavam lutando fora da Cidade Velha recuaram dentro de suas muralhas ao anoitecer e os grandes portões de madeira fecharam.
Naquela noite, o comandante jordaniano, brigadeiro Ata Ali Hazazeta, procurou o governador da Jerusalém jordaniana, Anwar al-Khatib. A eletricidade havia sido cortada, e os dois homens sentaram-se no escritório de Khatib, adjacente ao Monte do Templo, na escuridão, aliviados apenas por granadas de iluminação (flares) de Israel. Alto-falantes montados em um jipe das FDI do lado de fora das muralhas pediam aos moradores, em árabe, que pendurassem bandeiras brancas do lado de fora de suas casas.
“A batalha está perdida,” disse Hazazeta. Todos, exceto dois de seus 23 oficiais, haviam desertado, e as tropas não poderiam ser controladas sem eles. Os homens estavam desmoralizados e exaustos. Para salvá-los, ele disse, ele não tinha escolha a não ser se retirar antes que os israelenses atacassem. Khatib ficou chocado. Ele tentou argumentar que Hazazeta que 500-600 homens de Jerusalém, voluntários como oficiais, poderiam colocar-se uma luta eficaz em um labirinto como a Cidade Velha.
“As minhas tropas não estão em condições de resistir,” o brigadeiro respondeu. Pouco antes do amanhecer, ele os conduziu através do Portão de Dung, o único portão não bloqueado pelas tropas israelenses, e dirigiu-se para o Rio Jordão.
O Portão de Dung ainda existe e é a passagem principal de ônibus e carros que entram em parte da Cidade Velha. Era o acesso externo ao Bairro Marroquino, que foi removido para a construção da praça do Kotel. Até 1952 era um portão apenas para passagem a pé, mas a Jordânia o ampliou. Talvez você já tenha passado por ele e nem sabe. Foi construído no século 16.
Foi Begin quem colocou em movimento o ato final. Ele havia sido voto vencido no gabinete na noite anterior, quando pediu um ataque imediato à Cidade Velha. Acordando de um sono conturbado, ele entrou em contato com a BBC. A notícia principal era sobre um cessar-fogo no Oriente Médio que o Conselho de Segurança planejava convocar neste dia. Começa a telefonar ao Dayan e diz “não podemos esperar mais.”
Dayan concordou. Às 5:30 da manhã o general Narkiss foi contactado pelo vice-ministro da defesa de Dayan’. Haim Bar-Lev. Os paraquedistas deveriam atacar a Cidade Velha o mais rápido possível. O gabinete ainda não havia aprovado, disse ele, mas não havia dúvida de que seria em uma consulta e decisão por telefone. Qualquer ambiguidade persistente tinha sido posta de lado pelos desenvolvimentos em rápida evolução.
A saída da força de Hazazeta’ poupou os pára-quedistas que romperam o Portão dos Leões às 10 horas após um combate sangrento. (Dois israelenses seriam mortos dentro dos muros em escaramuças com uma dispersão de soldados jordanianos que haviam ficado para trás).
Quando Dayan chegou ao Monte do Templo, ele ordenou que uma bandeira israelense levantada por soldados no Domo da Rocha fosse removida. Ele logo ordenaria o controle de fato do Monte do Templo retornar às autoridades religiosas muçulmanas.
No Muro das Lamentações, Dayan leu uma declaração à imprensa: “Voltamos ao mais sagrado dos nossos locais e nunca mais seremos separados dele. Para os nossos vizinhos árabes, Israel estende a mão da paz; e para os povos de todas as religiões, nós garantimos a plena liberdade de culto e de direitos religiosos. Viemos não para conquistar os lugares santos dos outros, nem para diminuir os seus direitos religiosos, mas para garantir a unidade da cidade e viver nela com os outros em harmonia.”
Embora generosas e estadistas, as palavras de Dayan significaram que a Cidade Velha não seria abandonada.
Um comitê composto por altos funcionários públicos e um general foi nomeado para elaborar um projeto para Jerusalém. Três semanas após a guerra, o Knesset adotou suas recomendações, anexando 45 quilômetros quadrados que incluíam terras pertencentes a duas dúzias de aldeias árabes. Durante a noite, Jerusalém israelense triplicou de tamanho e Jerusalém jordaniana deixou de existir.
Pela narrativa palestina e marxista, Israel anexar 45 km quadrados de Jerusalém é um “roubo de terras”, já a Jordânia ter anexado toda a Cisjordânia é uma questão de soberania nacional. Muçulmanos são soberanos – judeus são ladrões. Depois, alegam que a “crítica” a Israel não é antissemita.
A área anexada foi definida, principalmente com base na segurança, não na santidade. Escolhendo terreno alto, os planejadores criaram um buffer para servir – militarmente e demograficamente – caso a guerra ameace novamente do leste.
O que havia sido Jerusalém jordaniana, incluindo a Cidade Velha de meia milha quadrada e o Monte das Oliveiras, constituía apenas 6% da terra tomada.
Mas a entidade murada, com suas muralhas e lugares sagrados, permaneceria o coração de Jerusalém, abrigando narrativas capazes de inspirar tanto a contemplação sublime quanto as guerras de foguetes.
Na história humana, Jerusalém sempre pertenceu ao grupo mais forte. Desde 7 de junho de 1967 o grupo mais forte é o Estado de Israel. Que os árabes da região esperneiem, é justo. Mas Jerusalém esta de volta ao domínio judaico e continuará assim.
por José Roitberg – jornalista e pesquisador – @historiacomzezinho